Artigo 
18/08/2021
Cinco caminhos para se tornar um embaixador da cultura de doação (começando hoje!)

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Por Roberta Faria e Rodrigo Pipponzi*

 

De uma coisa dá para ter certeza: os reflexos da chegada do coronavírus ainda serão sentidos durante muitos anos por todos nós. Só no Brasil, já vimos o PIB despencando, os postos de trabalho sendo duramente afetados e 14 milhões de brasileiros sofrendo sério risco de serem jogados na pobreza.

 

O caminho a ser trilhado daqui para frente não pode ser só o da recuperação para voltarmos ao que éramos. Mais do que uma postura insuficiente, essa é uma atitude irresponsável. O novo normal pede um redesenho da realidade, diferente de tudo que criamos até aqui. E em um país dolorosamente desigual como o Brasil, uma das ferramentas mais poderosas e ágeis para implantar essa mudança forma estrutural é o fortalecimento da cultura de doação.

 

O Movimento por uma Cultura de Doação existe desde 2012, mas ganhou ainda mais força e visibilidade no último semestre, depois de reforçar a importância de ajudar quem precisa – durante a pandemia e depois dela. Desde o ano passado, seus integrantes já elaboravam o documento Por um Brasil + Doador, Sempre (disponível para download gratuito), que reúne uma série de diretrizes práticas que podem ser seguidas por qualquer pessoa, física ou jurídica, que queira tornar os espaços à sua volta mais generosos. Mais do que isso, o documento procura mostrar que cultura de doação não é apenas desembolsar dinheiro em momentos historicamente difíceis, quando uma emergência se apresenta: é, principalmente, compreender que, quando ajudamos quem precisa, todas as pessoas se beneficiam, em todos os níveis da sociedade.

 

São cinco diretrizes neste documento, que nos permitem colocar a mão na massa hoje mesmo. Vamos a elas!

 

DIRETRIZ 1: educar para a cultura de doação
Como sei que é para mim?
Se você quer criar ambientes que priorizem a humanização do outro, com espaços seguros e férteis para falar sobre coletividade e cidadania, mostrando que solidariedade é mais do que só a caixinha de Natal em dezembro, comece por aqui.

 

Como posso agir?
Transformando o ato de doar em assunto recorrente, e mostrando que ela não representa esmola ou caridade, mas uma atitude poderosa para sermos protagonistas na criação de um mundo melhor.

 

Gestores podem dar o exemplo doando uma porcentagem próprio salário ou do lucro da empresa para uma causa em que acreditam – e, assim, iniciar conversas sobre a importância de apoiar iniciativas. As discussões no ambiente de trabalho sobre investimento social empresarial estratégico podem ser mais presentes, trazendo a filantropia como uma conversa menos intimidante para todos. Com mais pessoas falando abertamente sobre suas doações, possíveis tabus perdem força. E fica mais fácil sensibilizar e potencializar o ato de doar e inseri-lo no cotidiano de todos os cidadãos.

 

DIRETRIZ 2: promover narrativas engajadoras para doação
Como sei que é para mim?
Se você tem o poder ou ambição para tornar a cultura de doação uma conversa com visibilidade na mídia, representatividade e pluralidade, criando empatia e mostrando o poder transformador da generosidade, esse caminho é uma ótima escolha.

 

Como posso agir?
Aqui, a resposta é a diversificação. Que tipo de histórias de doação se conectam com a realidade das pessoas próximas a você? Quais são os caminhos para alcançar essas pessoas? Sobre o que elas conversam quando falam de doação e como você pode fazer parte dessa conversa? Como você pode criar conteúdo para mostrar o efeito transformador de uma doação e, assim, mobilizar aqueles que consumirem essa informação?

 

A resposta pode estar nas redes sociais. Nos noticiários televisivos. Em podcasts de variedades. Na novela das oito. No que seu público presta atenção e como pode ser comovido? Como usá-lo para furar a bolha e mostrar que a cultura de doação é um dever cívico de todos?

 

DIRETRIZ 3: criar um ambiente favorável à doação
Como sei que é para mim?
Se você pertence a um grupo de advocacy ligado ao terceiro setor, integra uma rede de organizações não-governamentais, tem poder de decisão no setor bancário, contábil ou de investimento social privado na sua empresa, arregace as mangas aqui.

 

Como posso agir?
Pergunte-se: como doar pode ser mais fácil? Quais são possíveis ações para desburocratizar esse ato? Como superar barreiras tributárias e democratizar o acesso aos serviços bancários para doações? É possível investir em novas tecnologias para promover pontes diretas entre doadores e donatários com transparência? Como adotar essa iniciativa e tornar a prática simples e acessível para dar visibilidade ao impacto social gerado por doações?

 

O trajeto aqui é longo e complexo, mas com grande potencial de fazer diferença. A longo prazo, podemos (e devemos!) pensar na reformulação de modelos jurídicos que reflitam as necessidades de novas alternativas de doação, levando em consideração assuntos como isenção e imunidade tributária ou outros caminhos para desoneração de impostos.

 

DIRETRIZ 4: fortalecer as organizações da sociedade civil
Como sei que é para mim?
Se você atua no terceiro setor, aqui é sua chance de brilhar. Esse caminho é para aqueles que querem fortalecer as organizações da sociedade civil em sua gestão, governança e transparência.

 

Como posso agir?
Hoje, ONGs brasileiras têm uma demanda elevada não só por apoio financeiro, mas também por profissionais qualificados, capazes de implementar projetos que gerem mudança sistêmica no terceiro setor, diminuindo a desconfiança de potenciais doadores para captar mais recursos e amplificar sua atuação.

 

O caminho aqui precisa daqueles que equilibram urgência das ações de curto prazo com a cautela dos projetos de médio e longo prazo. Fortalecer o terceiro setor é profissionalizá-lo. É torná-lo parte vital e vibrante da sociedade. É ensinar instituições a pedir doações e garantir que elas utilizem sua verba não só para agir diretamente em seu campo de atuação, mas também para investir em campanhas, pagar bons salários e manter a conta de luz em dia. É buscar caminhos para entrar na grade curricular do ensino superior e mobilizar jovens em formação profissional para que dediquem suas carreiras à cultura de doação.

 

(E é, também, abrir espaços para que elas possam brilhar. No primeiro semestre, criamos na MOL a Central de Impacto, um lugar onde todas as ONGs que já beneficiamos mostram seu trabalho com transparência total.)

 

DIRETRIZ 5: fortalecer o ecossistema promotor da cultura de doação
Como sei que é para mim?
Esse caminho é para os planejadores. Aqueles que são capazes de prover uma visão interconectada sobre o universo da cultura de doação, decodificando todos os seus aspectos sociais, demográficos e econômicos e, enfim, criando novas medidas para incluir cada vez mais pessoas em um movimento inclusivo, forte e democrático.

 

Como posso agir?
O ecossistema da cultura de doação e da filantropia no Brasil precisa atuar de forma cada vez mais integrada, alinhada e estratégica, com objetivos claros para todos. Nesta diretriz, tão importante quanto criar medidas para isso é traçar metas e planos concretos com prazos estabelecidos.

 

Quais são as formas de fomentar novos espaços para promover a cultura de doação no Brasil? Que estratégias podem ser adotadas para tornar a causa atraente e sensibilizar investidores sociais, trazendo uma fundação sólida para o campo e, ao mesmo tempo, capilarização e representatividade nacional?

 

Igualmente importante aqui é o estabelecimento do compromisso claro: onde você vê a cultura de doação daqui 20 anos no seu nicho de atuação? Para ela chegar lá, onde precisa estar daqui 10 anos? E em 5 anos, 2 anos, 1 ano? Que iniciativas precisam ser colocadas em prática hoje, aqui, agora? Quem você deve procurar e o que você vai pedir? Que prazo vai estabelecer?

 

Talvez você se pergunte por que deveria se preocupar, considerando que também está contando seus danos e analisando seus próprios prejuízos durante essa pandemia. E a resposta é simples: não há sobrevivência social sem solidariedade. Não há prosperidade verdadeira enquanto também houver miséria. No longo prazo, tornar-se embaixador dessas diretrizes significa ser protagonista na diminuição das desigualdades.

 

Mais do que pessoas com boas intenções, nosso país precisa de gente que queira mudar a forma como enxergamos a filantropia. E o primeiro passo a ser dado é abranger nosso olhar entendendo que doação é distribuição de renda. É educação para a filantropia. É iniciativa coletiva. E começa com você.

 

Leia o documento do Movimento por uma Cultura de Doação. Procure pelo menos uma diretriz em que você ou seu negócio podem se encaixar. Trace metas para colocar processos em prática da mesma maneira que você traça metas de lucratividade. Assuma o compromisso com o presente e o futuro. Nós temos certeza: com esse pensamento, todo mundo vai sair ganhando.

 

*Texto publicado na coluna Razões para Doar, de Época Negócios, em setembro de 2020.

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