#Transcrição EP 73 – Os jovens vão salvar o mundo?

Roberta: Pesquisas apontam que a Geração Z está envolvida em temas sociais, preocupada com a diversidade, com o consumo consciente e em “resolver os problemas que as gerações anteriores deixaram”. Mas, se por um lado os jovens entendem a necessidade de transformação e têm sucesso em influenciar outras pessoas e mobilizar arrecadações, por outro, no Brasil eles ainda são a minoria entre os voluntários.

 

Para entender como engajar e estimular o protagonismo dessa geração, hoje a gente vai conversar com o Edgard Gouveia Jr.. O Edgard é cofundador da LiveLab, empresa que desenvolve jogos colaborativos para a transformação social, e idealizador da Jornada X, um jogo que desafia crianças e jovens a mobilizar suas comunidades para questões sociais e ambientais.

 

Eu sou Roberta Faria.

 

Artur: Eu sou Artur Louback.

 

Roberta: E entender se e como os jovens podem mudar o mundo é o assunto de hoje no… 

 

Jogral: Aqui se Faz, Aqui se Doa!

 

Roberta: Está começando mais um Aqui se Faz, Aqui se Doa, o seu podcast semanal sobre cultura de doação produzido pelo Instituto MOL, com apoio do Movimento Bem Maior, da Morro do Conselho Participações e da Ambev, além da divulgação do Infomoney. 

 

Em 2019, a jovem sueca Greta Thunberg chamou a atenção de todo o mundo ao discursar na Cúpula de Ação Climática da ONU. Ela tinha apenas 16 anos de idade, e no ano anterior ficou conhecida por protestar em frente ao Parlamento de seu país, cobrando uma ação mais efetiva contra as mudanças climáticas. A atitude de Greta foi uma grande inspiração para jovens de diversos países, que passaram a promover ações similares em suas cidades. 

 

Artur: Em um ano, o movimento encabeçado por Greta, intitulado Fridays for Future, já tinha chegado a mais de 100 países, reunindo milhões de pessoas. Um estudo feito nos Estados Unidos sobre o chamado “Efeito Greta Thunberg” concluiu que a jovem incorpora o que os psicólogos chamam de “eficácia coletiva”. Ou seja, o entendimento de que, trabalhando com outras pessoas, mesmo que elas não tenham status ou autoridade, podemos contribuir para a mudança.

 

Roberta: Mas será que todo jovem tem esse poder? Bom, pelo menos o senso de responsabilidade, boa parte da Geração Z já tem. Segundo um estudo da McCann feito em 26 países, 62% dos jovens entre 18 e 24 anos acreditam que sua geração pode resolver grandes problemas globais. No Brasil, 81% acham que têm a responsabilidade de contribuir positivamente com a comunidade em que vivem. E 75% entendem que sua geração tem o poder de influenciar as ações e comportamentos de uma marca para melhor. 

 

Artur: Em resumo, quando perguntados sobre como gostariam que a Geração Z fosse lembrada, a resposta foi: como alguém que mudou o mundo de uma forma positiva. Segundo o estudo, eles têm um desejo comum de gerar mudança “antes que seja tarde demais”.

 

Roberta: Bom, mas já que a gente tá falando de Geração Z, acho que é bom explicar esse termo. E pra isso, ninguém melhor do que a nossa querida Rafa Carvalho.

 

Rafa Carvalho: Oi, pessoal! Tudo bem? Bora pra mais um glossário?

 

Geração Z. Não existe um consenso sobre a exatidão do período, mas em geral se chama Geração Z aquela das pessoas nascidas entre 1995 e 2010. A letra Z é porque elas vêm depois da Geração X, nascida nas décadas de 1960 e 70, e da Geração Y, também conhecida como Millennials.

 

Um estudo feito pela McKinsey e a Box1824 mostra que a Geração Z se diferencia dos Millennials em alguns aspectos bem importantes quando falamos de questões socioambientais e do futuro da humanidade. 

 

Por exemplo, enquanto os Millenials viram o surgimento da internet, a Geração Z já nasceu com ela. Por isso são chamados de “nativos digitais”. São pessoas que cresceram acostumadas a acessar e analisar muita informação ao mesmo tempo. Além disso, elas foram criadas em períodos de graves crises econômicas. Por conta desses dois fatores, em especial, a Geração Z é menos idealista, mais realista e mais pragmática do que os Millennials. 

 

Outro ponto é que, enquanto os Millenials eram mais individualistas, a Geração Z valoriza muito a criação de comunidades e o diálogo, prezando pela diversidade. 

 

De acordo com o Bank of America, o poder econômico da Geração Z foi o que cresceu mais rápido entre todas as gerações, e deve representar mais de um quarto da renda global até 2031.

 

E então? Com tudo isso em vista, você acredita que os jovens dessa geração podem mudar o mundo para melhor?

 

Eu sou a Rafaela Carvalho e toda semana ajudo a desvendar um termo importante para a cultura de doação. Até mais!

 

Artur: Muito obrigado, Rafa! Acho que aqui a gente está falando de um potencial de protagonismo muito grande, mas que depende de fatores que vão além. Na própria pesquisa da McCann, que a gente estava falando antes, 34% dos jovens entrevistados disseram que sentem que os problemas de hoje podem ser grandes demais para a Geração Z resolver por conta própria.

 

Roberta: Pois é, Artur. A gente conversou com uma jovem brasileira, que traz uma perspectiva de como a nossa geração e as anteriores podem ajudar nesse movimento. A Lívia Maria Souza tem 18 anos e faz trabalho voluntário desde os 12. Em 2020 ela criou o projeto Levanta Jovem, uma mentoria para desenvolver a liderança e o espírito empreendedor em jovens da sua cidade, Capanema, no Pará. Primeiro ela nos contou por que decidiu se dedicar a essa iniciativa.

 

Lívia Souza: Eu já participei de 15 programas de liderança, de trabalho voluntário, e sempre que eu era aceita nesses programas, e que se iniciava a jornada com esses programas, eu via que às vezes eu era a única nortista, ou que às vezes tinha apenas outra pessoa representando o Norte do Brasil. E isso sempre me fez questionar muito. Por quê? Por que que a gente tem uma representatividade mínima nesses programas? Por que a gente tem um engajamento mínimo nessas atividades extracurriculares, fora da escola? Então essa minha percepção da falta de protagonismo juvenil ela veio muito da observação da minha realidade, do meu contexto local, mas também regional, em nível de Norte, de ver que programas de liderança, programas que focavam na juventude, estavam tendo uma baixíssima adesão. Eu acho que tem dois fatores principais a que eu atribuo esse problema. Primeiro é a questão da perspectiva, o mindset. Eu vejo que na nossa região a gente tem um terrível problema de baixa autoestima, o jovem não se achar capaz, o jovem às vezes olhar pra sua realidade, de ser de baixa renda, de vir de uma família humilde ou ser de escola pública, e não se ver capaz de mudar essa realidade, ou de viver e experienciar coisas além dessa realidade. E às vezes até os próprios líderes locais carregam essa perspectiva, de “ah, você é daqui e você não consegue chegar mais longe”, ou ocupar outros espaços de liderança por conta das suas situações, das suas circunstâncias. O segundo ponto é a questão da falta de investimento mesmo, do governo, das lideranças políticas, em projetos focados para a juventude, em projetos focados para o desenvolvimento do protagonismo juvenil. Eu sinto muito falta disso, eu sinto que os jovens que trabalham nessa área eles não têm o suporte adequado para poderem desenvolver essas ideias e implementarem.  

 

Artur: Muito importante isso que a Lívia aponta, da falta de investimento. E ela também falou sobre outra coisa fundamental, até anterior ao apoio financeiro, que é a confiança no potencial do jovem. Vamos ouvir.

 

Lívia Souza: Eu acredito que às vezes, as pessoas não acreditam no potencial dos jovens porque elas não vêem os jovens fazendo algo, não vêem os jovens sendo responsáveis, ou liderando iniciativas, às vezes se torna muito raro, às vezes o jovem que faz um projeto, que lidera uma ONG, um caso muito único… Mas eu acredito que isso é um problema, porque se o jovem não está sendo protagonista, alguma coisa está errada. Não é porque ele não quer. É porque talvez ele não tenha os recursos e o suporte que ele precisa pra fazer isso. Então se você conversa com os jovens, com uma mente muito aberta, pra entender a fala desse jovem, você vai perceber que os jovens têm muitas ideias, eles têm uma mentalidade muito fantástica para essa questão de colaborar com a comunidade. Mas às vezes essa falta de suporte, às vezes a questão do trabalho voluntário, do servir não é algo que vem da família, não tá presente no ambiente familiar e nem na escola, então como que esse jovem vai se desenvolver? Acaba se tornando muito difícil ele ser um protagonista, ele mudar o mundo, se ele não tem o conhecimento e o suporte pra fazer isso. A mudança começa quando a gente oferece um ambiente propício pra que esse jovem se desenvolva. Então fornecer treinamentos focados pra liderança, permitir que os jovens tenham experiência de liderança, de criar um projeto, dar este passo de confiança. Então eu realmente acredito que é imprescindível os nossos líderes pararem e ouvirem a nossa juventude, entenderem quais são as pautas, os problemas que eles vão falar sobre, e dar todo o suporte, tanto de recursos financeiros, mas principalmente de estar presente, de dizer eu acredito em você, eu confio no que você tá querendo propor e a sua voz importante nesse meio. 

 

Roberta: O Levanta Jovem, projeto da Lívia, já alcançou mais de 100 jovens na região Norte e foi um dos premiados do 7º Desafio Criativos da Escola, promovido pelo Instituto Alana. A mentoria aborda temas como autoconhecimento, inteligência emocional, trabalho em equipe, comunicação, advocacy e, claro, liderança. 

 

Artur: É, como a Lívia falou, o caminho é ter uma escuta ativa e dar espaço para essa geração, mas com orientação. Ajudar o jovem a sentir que pode ser protagonista. E como fazer isso sem parecer chato? Nosso convidado de hoje com certeza vai saber responder a essa pergunta. O Edgard Gouveia Jr tem uma longa trajetória dedicada a mobilizar jovens para a transformação social. Entre muitas outras coisas, ele é fundador da LiveLab, empresa que desenvolve tecnologias e estratégias de jogos colaborativos para a transformação social, e criador da Jornada X. 

 

Roberta: Seja bem-vindo ao nosso podcast, Edgard!

 

Edgard: Obrigado, Roberta! Estou bastante feliz, bastante animado com essa conversa boa. 

 

Roberta: Edgard, para começar a gente queria saber como e por que você começou a atuar tendo esse foco na mobilização dos jovens para causas sociais, e também que você conte sobre a Jornada X. 

 

Edgard: A Jornada X, ela vem com essa brincadeira de “e se construir o mundo dos nossos sonhos, pudesse ser rápido, divertido, que a gente não precisasse colocar a mão no bolso, e criar uma mudança espetacular?”. Então, já que a gente vai criar um mundo melhor, para as nossas crianças, para os nosso adolescentes, que tal se mudar isso pudesse se transformar em uma aventura, uma brincadeira, uma jornada épica? Então, a nossa Jornada X, ele pretende ser, ela tem sido, um game e dentro do brincar, as crianças são super-heróis. São muito melhores que a gente, as crianças tem vantagem para negociar, para entender… é um jogo em que eles vão lá e a gente desafia eles a mudar, montar times de super-heróis, brincar de Harry Potter, de X-men, eles adoram, entendem direitinho. Eles olham tudo que no seu bairro não está bom, eles falam: nossa, não tem árvore, não cultura para jovens, não tem diversão. Então, é desafiar eles a fazerem isso acontecer, bota a culpa nos adultos… o desafio de vocês não é fazer a mudança, os adultos que irão fazer isso, vocês podem mobilizar os adultos e eles olham para a nossa cara e tiram sarro: ah, é? Convencer meu pai? Eu sei o que vou fazer, eles sabem seduzir, sabem gritar. Então, essa busca tem que entregar para eles. Esses jovens, essa nova geração, uma outra ferramenta que não seja bélica, que não seja um sacrifício, que não seja um sacerdócio, não seja uma luta, né? Mudar o mundo não precisa ser o que a gente aprendeu que é. Uma luta, um sacrifício, um sacerdócio… a gente já fecha o olho e pensa: eu tenho que trabalhar na  manhã seguinte, levar meus filhos para a escola, a gente foge. Mas se for um jogo, uma festa, uma aventura, até o adultos colam para ver o que eles estão fazendo. 

 

Roberta: Edgar, é muito incrível te ouvir e eu vou pensando na minha experiência pessoal, de mãe. Eu tenho quatro filhos, com idades entre 3 e 23 anos, e olhando essa turma, de fato eu tenho essa sensação e as estatísticas, as pesquisas também mostram isso que é a geração mais engajada em causas, por outro lado, quando a gente vê pesquisas que avaliam o terceiro setor, métricas tradicionais do terceiro setor, como por exemplo a Pesquisa Voluntariado Brasil 2021, notou que nos últimos 10 anos diminuiu o número de voluntários entre 16 e 29 anos. Será que as nossas ferramentas tradicionais de filantropia, de terceiro setor estão fadadas a acabar, vão servir para essa geração? Essa é a grande questão que a gente costuma observar dos nossos próprios ouvintes, a maioria é do terceiro setor, trabalha com captação de recursos, e fica essa dúvida muito grande: como que a gente comunica, como que mobiliza e faz esse passo além, do ativismo digital, do abaixo-assinado no Avaaz para uma mobilização de fato, de chamar esse pessoal para dentro das instituições para ser voluntário, para ser doador, para ser mobilizador. Ou será que não vai precisar mais de instituições formais para isso, o WhatsApp já dá conta. Essa mobilização, como que funciona? O que você acha?

 

Edgar: Eu acho que a gente vai ter que desenhar outros formatos. Eles não estão terceirizando as coisas. Eles tem muito essa questão da micro-política, começa por mim. Eu, vou ter uma outra relação com os outros gêneros, como vou tratar, como vou acolher. Eles são a própria política, né? Meu corpo é político, minhas relações são políticas, minha turma é construída desse jeito. E eles não tem nenhuma coisa contra a gente, né? Até com a mãe e o pai, eles dizem: mãe, você não pode falar isso. Vai diretamente, né? Eles vão para outro lugar, não é uma coisa que terceiriza, “vou doar e alguém vai fazer”. “É nois, agora”. Então tem alguma coisa que talvez não esteja no lugar do “não doar”, eles estão em um lugar que já estão agindo. E nem faz sentido, eles nem olham para esse lugar. Talvez a gente tenha de ver uma outra coisa, para depois talvez criar ferramentas de doação, porque talvez as nossas estejam ultrapassadas, não é por aí que vai. Entender o que eles estão fazendo e vai passar rápido isso, eu quero acreditar que sim, mas as crianças biologicamente aprendem muito com o brincar, com o observar, com a conexão. Então o mundo da gente é deixar eles brincarem de super-heróis, encontrarem seus super poderes, todos juntos, usar bastante a internet, que é uma ferramenta incrível, a gente não usa com o poder que tem, eles estão usando mais e entender o conceito que o Tik Tok, Instagram tem de nos dar ideias, de mudar o mundo, esse mundo que eles sonham. Quais são as narrativas que vão, de fato, levá-los a uma coisa que aí sim é comum, mas como é que a gente pode olhar isso com outras lentes? para a gente entender como é que essa ferramenta que a gente cria, que leva na essência da doação, que pode ser outras formas que a gente não usa ainda.

 

Roberta: Massa! Isso que você falou é legal, que a gente ouviu no começo do episódio uma jovem que criou um projeto para estimular o protagonismo socioambiental no Pará. Ela falou que percebeu uma falta desse protagonismo jovem na região, e que um dos motivos é a ausência de exemplo e de incentivo em casa e na escola. Você acha que a Geração Z está mais influenciando do que sendo influenciada quando se trata de ativismo social? 

E uma outra questão, que você está aí desde a faculdade, com mais de quinze anos de empreendedorismo social ao lado de jovens, você já viu crianças que são hoje adultas e como é que essa influência de engajar o jovem? essa influência de se engajar desde cedo, você vê isso sendo carregado a vida toda ou é uma experiência que fica na juventude? 

 

Edgar: No meu olhar, nas primeiras memórias que me vem quando você fala isso, é que não se solta mais, né? E talvez a pessoa se engaje em uma outra coisa, vá para uma empresa, tenha um outro cargo, não importa qual cargo tenha sido, mas se não tiver atuante, ele se sente mal, né? Se entende que, se passou por isso, não consegue soltar. Essa é a minha percepção. Pode ter um caso ou outro, que eu mal consigo lembrar, mas é raro. É raro que você tenha sido marcado na história, na sua juventude por estas questões e não tenha seguido pelo resto da vida. É uma questão biológica, são memórias, lembranças que ficam impregnadas e se você sentiu prazer naquilo, você tende a repetir e isso é muito importante.

E eu tenho 25 anos, 25 anos de trabalho social, e sem contar ainda a parte estudantil, né? que aí vai para 30, contando a faculdade… meus cabelos brancos não negam. (risos)
Agora, quando a gente pensa o que está acontecendo, é que tem ferramentas… primeiro, tem livre informação, então muito mais cedo eles estão tendo qualidade, quantidade de informação que a gente não tinha. Eu, quando era criança, meu interesse era a natureza, eu lembro quando era criança, o interesse que eu tinha de conhecer, de me conectar, de me apaixonar pelas orcas, pelos pinguins, pelos felinos da África, e o que tinha era o livro Os Bichos, né? A enciclopédia Os Bichos, que tinha uns desenhos, aquarelados, maravilhosos… e agora tem Nat Geo, que tem várias séries, o History, e lá tem todo o movimento, toda a história, os filhotinhos, dentro da barriga da mãe, então, se eu fosse criança hoje, eu ia me apaixonar de um jeito, uma conexão com os nativos da região, como é que eles são mortos e por quê, e aí a cena vai lá para a China, a pata do tigre… e então você começa a ter uma relação e criança adora imagem! E se você dá imagens e áudios, você pega tudo, né? Criança é muito sensível. Então, o nível de informação e o nível de detalhes, e você sabe, você é mãe, você sabe. Eles sabem argumentar, eles têm um nível de informação que eles já vem e argumentam. Cheios de informação que os pais nem sabem, você dá um YouTube, um Google e eles falam ‘não pai, não é assim’… Então, é muita informação, que a gente não tem, então, eles sabem que a maior autoridade de conhecimento não é mais o pai e nem a mãe ou os professores. Na sala de aula eles conseguem saber na hora se aquilo que se está falando é verdade… Então, isso dá uma certa autonomia para poder discutir. A criança já tem naturalmente, com todos os seus direitos, mas aí tá com uma certificação imediata, rápida, não vai ser no próximo semestre que eu vou aprender, só no terceiro ano… Antigamente a gente ouvia, ‘ah, isso só no terceiro ano’ e aí você tinha que esperar o terceiro ano. Não, agora é na hora! Imagina se eles podem entender a nossa maneira de mudar o mundo? Não adianta: tem que crescer, estudar, ir para a faculdade, brigar no Senado, fazer pressão na rua.. demora. Eles não estão para isso. Eles vem e dizem: vamos mudar isso aqui?, “então, gente, o dia inteiro, ninguém vai tomar coca-cola”, e se eles falarem isso, na geração deles, a Coca-Cola vai sentar com eles para negociar muito rápido. Um dia só. Só 1% de impacto nas vendas, “parou, parou, vamos conversar geração”… Então, estas coisas que eles vão começar a descobrir, estão descobrindo e estão fazendo, não passavam pela nossa cabeça, que foi treinada, adestrada, que o jeito de apoiar a mudança social é doando dinheiro para fazer acontecer ou entrando em partido político, marchando, entregando este poder na mão de outras pessoas, esperando quatro ou cinco anos para uma próxima eleição.

 

Roberta: Querido, muito obrigada por compartilhar com a gente toda a sua sabedoria e a sua experiência. Eu tinha mais muitas perguntas a fazer, mas a gente tem vinte minutos geralmente, só e precisamos encerrar. Mas agora a gente tem mais uma outra parte, que é a nossa Rodada Relâmpago, você tá preparado? 

 

Nós vamos fazer 5 perguntas e você responde com a primeira coisa que vier à sua cabeça. Ok?

 

Edgard: Vamos lá!

 

Roberta: Qual foi a sua doação mais recente?

 

Edgard: Foi para o KES Summit. Eu acabei de voltar da Espanha e participei lá de uma rede incrível de bem-estar. E eu me doei para estar lá, eu poderia estar aqui bem quietinho na pandemia, mas me doei para estar lá e fazer o pessoal dançar, jogar, e doar meu coração aberto, sem medo para fazer de fato as pessoas se juntarem.

 

Artur: Qual é a sua causa do coração?

 

Edgard: Meio ambiente (…) A natureza para as gerações futuras.

 

Roberta: O que você doa e que não é dinheiro?

 

Edgard: Eu doo a minha vida inteira. Me comprometi aos 12 anos de idade, fiz uma promessa de que eu iria viver ou morrer para que nossos filhos e netos, e eu não tenho filhos e netos, tenham o direito e o privilégio que eu tive, de nadar em um rio cristalino, se banhar em uma cachoeira, o mar verde… Para mim é isso, eu doo a minha vida inteira. Tudo o que eu fiz, o que eu estudei, tem um comprometimento muito forte para que essa maravilha continue e não ceda a nossa adolescência humana. 

 

Artur: Cite uma organização ou um projeto que você admira e/ou apoia:

 

Edgard: São muitas… mas me veio uma organização, da comunidade da Maré, que trabalha com mulheres, coders, que ensina programação para mulheres poderem desenvolver e dar um salto na vida econômica, gerar soluções… tem uma que conheci na Espanha, que trabalha com golfinhos (…)

 

Roberta: Na sua experiência, qual é o argumento ou o que você diria para alguém que não é ainda um doador, o que você diria para convencer essa pessoa a se tornar?

 

Edgard: Na minha experiência, são histórias. Falou em doar é perder dinheiro… é botar a mão no bolso e perder dinheiro. A gente foi tão treinado, tão adestrado a não perder dinheiro, a segurar, tentar dizer o contrário é uma briga injusta, e mais ainda, sutil. Então, eu contaria histórias. A gente é muito movido a histórias, então eu conto histórias, eu não conto da miséria, do horror, e tem coisas muito cativantes, contar essas histórias dos golfinhos com esse menino… as pessoas sorriem, e aí, pela generosidade, a gente doa muito mais. A gente bota a mão no bolso para ter um churrasco legal, né? porque vai ter uma promessa de felicidade, né? As comunidades no Rio de Janeiro botam muito dinheiro nas escolas de samba, às vezes a gente não tem, mas a gente paga para ter aquela fantasia, paga para trabalhar… A gente tem que chamar as pessoas não pelo lugar da dor, talvez muitas igrejas fizeram isso, né? “Ah, você vai ganhar um espaço no céu”, tem uma conexão com a dor, você dá, assim meio preocupado. Mas, realmente quem doa muito mais é quem doa pela alegria. Eu contaria histórias bonitas, uma história interessante “você não sabe onde eu fui, você não sabe as coisas que as pessoas fazem e a gente quer fazer mais ainda, quer ajudar a gente a construir mais ainda, a ampliar esse paraíso?”, aí as pessoas vão doar. 

 

Roberta: Que belíssima dica! Muito obrigada, querido. Adorei conversar com você aqui, volte sempre aqui para contar novos capítulos da Jornada X e Live Lab. 

 

Edgard: Muito obrigado, Roberta. Vamos trazer a alegria de viver de volta para a juventude. Tamo juntos e juntas!

 

[sobe som marcando fim da entrevista]

 

Roberta: Bom demais esse papo, né? A gente sai com mais vontade ainda de criar pontes com a Geração Z e trabalhar junto na missão de melhorar o mundo. Ou, entregar logo as chaves para eles, “toquem aí, que vocês estão sabendo fazer melhor e a gente não tá entendendo mais nada”. 

 

Artur: Com certeza. No final das contas, essa é uma missão de todas as gerações, né? Melhorar o mundo que receberam. Então é muito importante a gente se olhar como parceiros, em todas as idades. Mas o mundo é mais deles dos que estão ficando velhinhos, né? Pelo tempo que tem pela frente. Especialmente nós, que temos filhos, portanto temos interesse pessoal, acima de tudo na melhora do mundo e sabemos bem como as crianças e os jovens podem nos ensinar muitas coisas. 

 

Roberta: Verdade, Artur. E falando em aprender e conhecer coisas novas, hora de chamar a Duda Schneider, que toda semana apresenta pra gente um novo produto social. O que será que ela traz hoje no quadro Merchan do Bem? 

 

Duda: Oi, gente! Eu sou a Duda Schneider e esse é o Merchan do Bem!

Hoje, a dica são os livros da editora Voo, que assim como a Editora MOL é uma editora social que reverte parte da venda de seus livros a projetos e causas!

Atualmente, a Voo destina 3% do seu faturamento a um conjunto de ações que fazem parte do projeto Um por Um, que nasceu junto com a editora. Além da doação a projetos e causas, a cada livro vendido, a editora doa novos livros, material de arte e também aula de música às crianças.

E o catálogo oferece não apenas livros infantis, mas uma diversidade de títulos de ciências e humanidades que trazem conteúdos de impacto para inspirar e empoderar agentes de transformação.

Muito legal, né? Conheça o projeto no site da editora, que é o www.editoravoo.com.br

Espero que tenham gostado, até a próxima!

 

Artur: Roberta, acho que este episódio vai ajudar muita gente a repensar o olhar pra Geração Z. Não só sobre a sua capacidade de ser protagonista das mudanças sociais e ambientais, mas também sobre como fortalecer esse potencial e empoderá-los ainda mais.

 

Roberta: Pois é, Artur. No episódio 56 a gente falou sobre a próxima geração de doadores, e como os mais jovens já têm vindo com uma espécie de “chip da solidariedade”. Mas como a Lívia disse aqui, a gente precisa acreditar, ouvir e dar espaço, mas com orientação. E criar conexões baseadas na verdade, porque isso é outra coisa que os estudos apontam: embora seja muito digital, essa geração valoriza o real. Então não adianta você dizer que está fazendo algo para mudar o mundo se de fato não está. Eles estão super atentos a isso, seja nas relações com empresas ou com organizações da sociedade civil. 

 

Artur: Agora é uma parte livre para os nossos comentários, e esse é um tema que eu piso em ovos, porque na verdade eu odeio o negócio de especular sobre jovens… porque quando eu também era jovem, eu odiava quando me colocavam em um balaio que eu sentia que eu não cabia, tipo “os jovens são” e sempre tem uma frase do tipo “jovem é”, alguma coisa e vai errar. Jovem não é uma característica pessoal ou alguma coisa assim, né? é uma idade, que contempla gente de tudo quanto é tipo, de todas as condições socioeconômicas, de todos históricos e tudo mais … Então, eu acho que a única coisa que nos cabe é estimular, motivar, para que pessoas que venham depois da gente tenham energia para fazer melhor do que a gente fez, e é isso que eu tento passar para os meus filhos e daí se todos os jovens que eu conheço tem que fazer isso, no trabalho e tal… Então eu acho que tem um problema muito grande e eu vejo isso em muitas empresas, eu trabalhei em muitas empresas em que os mais velhos tem um temor das gerações que estão chegando, se sentem ameaçados, e por isso muitas vezes boicotam a formação de seus sucessores ou tem que fazer críticas às gerações mais jovens, enquanto que cabe a gente, seres que levaram uma vida toda para moldar seu caráter, corrigir suas imperfeições, tentar ser uma pessoa melhor, cabe à nós também aprender que é nossa função, também, passar o bastão para que ele seja bem conduzido. Então, umas das coisas que eu me orgulho na minha vida e que modéstia à parte eu faço bem, é cuidar dos meus sucessores. Sempre tento sair e deixar a fila andar. É um modus continuum , a gente tem que ir andando para a frente e dando moral para que os próximos, que sejam melhores que a gente, e isso me estimula acreditar, e por isso eu tenho o tanto de filhos que eu tenho, que o mundo, mesmo que por vias tortas, vai melhorando um pouquinho. E no caso dessas pesquisas que a gente viu hoje fica evidente que, pelo menos no discurso ou moralmente, parece que está melhor mesmo. Bom, e aí só cabe a mim e eu tenho que acreditar que a gente tá andando para a frente, né? que as coisas estão melhorando, mas é que a vida é complexa, ela não é tão pragmática, as coisas pioram de um lado para melhorar do outro, mas se as pesquisas que a gente falou hoje no programa deixam evidentes que os valores estão melhores, os jovens estão enxergando algo melhor, o mundo mais cuidadoso, mais inclusivo, mais diverso, menos agressivo com o meio ambiente. Se eles vão conseguir levar isso à prática, ou se eles vão conseguir reverter um movimento que o capitalismo impõe de forma exagerada, fazer um capitalismo mais sofisticado do que o que a gente tem hoje, cabe torcer que sim, que dê certo este movimento. E eu acredito que sim, andamos para frente.

 

Roberta: Mexeu muito comigo a fala do Edgar, de como essa geração não terceiriza e usa o próprio corpo e existência como uma forma política. E eu fiquei lembrando, eu tinha 11 anos, quando aconteceu a ECO 92, muito antes da Greta nascer, e na época eu lembro que era assinante da Ciência Hoje para crianças, uma revista que durante aquele ano veio com uns posters dos animais brasileiros em extinção, tinha um jacaré de papo amarelo… e cada edição, alguns que eu tirei do miolo da revista, toda cuidadosa, pendurei na parede e me associei lá, você escrevia uma carta, mandava o dinheiro, mesada dentro do envelope, preenchendo o papel para se tornar sócio daquela causa, era uma forma de doação. Me lembro que tinha uma carteirinha, não sei se era exatamente uma ONG, mas tinha uma coisa de se tornar sócio daquela causa, um apoiador da causa, enfim… E quando ele falou, nunca me ocorreu nessa idade, me tornar vegana ou vegetariana, e então, hoje eu sou doadora do Greenpeace, mas não me tornei vegana ou vegetariana, então, eu fiquei pensando muito como isso é um exemplo que a gente tem de levar para a nossa geração – o quanto a gente tá ainda terceirizando as mudanças, em vez de ser a mudança de fato, né? Aquela famosa e batida frase de ser a mudança que a gente quer ver no mundo, eu acho que eles exercem isso muito melhor do que a gente, e isso é uma grande lição para nós.

Artur: Então é isso, bela fala da Roberta, engajada desde muito jovem… E de fato tem uma coisa muito legal agora, que eu não conheço nenhuma menina pré-adolescente que não seja, em alguma medida, feminista. Isso aí, pra mim, já tá suficiente para o mundo melhorar. Então, estamos bem.

Por hoje é isso pessoal, mas o papo, como sempre, continua nas nossas redes sociais. Segue a gente lá no Instagram, @institutomol, e no LinkedIn. Semana que vem a gente volta! Esse podcast é uma produção do Instituto MOL, com apoio do Movimento Bem Maior, da Morro do Conselho Participações e da Ambev, além da divulgação do Infomoney. Esse episódio teve produção da Mônica Herculano. O roteiro final e direção são de Ana Ju Rodrigues e Vanessa Henriques, arte da Glaucia Ribeiro, do Instituto MOL. As colunas são de Rafaela Carvalho e Duda Schneider, da Editora MOL. A edição de som é do Bicho de Goiaba Podcasts. Até mais!

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